Como cineasta, Céline Sciamma cria mundos onde a igualdade pode existir mesmo em relacionamentos notoriamente desiguais. Em 2019, ela conseguiu igualar o campo de jogo entre um artista e seu assunto em Retrato de uma senhora em chamas, e ao fazê-lo, criou um dos romances de tela mais indeléveis da memória recente. Três anos depois, Sciamma tenta fazer algo semelhante em seu último filme, Mamãezinha.
O filme, uma fantasia delicada e silenciosamente comovente, se atreve a tentar preencher a lacuna que existe entre uma mãe (Nina Meurisse) e sua filha, Nelly (Joséphine Sanz). Quando o filme começa, os dois viajam juntos para a casa da avó recentemente falecida de Nelly para limpá-la de quaisquer pertences restantes da mulher. No caminho até lá, Nelly silenciosamente alimenta sua mãe com lanches no banco de trás, as duas se comunicando através de uma série de toques e acenos silenciosos.
Pouco depois de chegar, a mãe de Nelly sai de casa, deixando sua filha e marido (Stéphane Varupenne) para terminar o difícil trabalho sem ela. Nelly passa a maior parte do tempo lá explorando a floresta próxima, onde ela finalmente se depara com um forte feito por outra garota, Marion (Gabrielle Sanz). Os dois têm mais ou menos a mesma idade e são incrivelmente parecidos (os atores que os interpretam são, notavelmente, gêmeos na vida real), e uma rápida viagem à casa de Marion leva Nelly a descobrir que sua nova amiga é na verdade uma versão de sua mãe do passado.
O filme, que dura apenas 72 minutos, nunca para para explicar a magia que permitiu a Nelly conhecer o eu mais jovem de sua mãe. Sciamma, que dirigiu o filme e escreveu seu roteiro, não está interessado em atolar Mamãezinha para baixo com qualquer exposição desnecessária ou senso forçado de lógica. Em vez disso, ela conta o filme em um ritmo medido e evita complicar demais sua história simples, usando as brincadeiras de Marion e Nelly como forma de aproximar esta última de sua mãe.
Ao longo de seu tempo de execução, o filme gradualmente acaba com a desordem e as paredes que impediram Nelly de entender completamente aqueles que ela mais ama. Cada cena do filme serve apenas para fortalecer e aprofundar ainda mais os relacionamentos de Nelly com sua mãe e, através de várias conversas ternas de tirar o fôlego, com seu pai. O filme foi filmado por Retrato de uma senhora em chamas a diretora de fotografia Claire Mathon, e seu olhar suave e caloroso só reforça ainda mais a ternura e a empatia presentes no roteiro de Sciamma.
Ao discutir o filme, Sciamma frequentemente citado a obra de Hayao Miyazaki como influência Mamãezinha, e a conexão entre os filmes do animador japonês e seu mais recente é inegável. Como muitos dos filmes de Miyazaki, Mamãezinha entende que o mundo de uma criança é aquele em que a magia pode ser encontrada em qualquer esquina ou nos movimentos das sombras na parede. Ele usa essa magia para contar uma história profundamente humana, onde uma simples jornada em uma floresta próxima tem o poder de fechar a lacuna de compreensão que existe entre pais e filhos.
Mamãezinha chega aos cinemas na sexta-feira, 22 de abril.
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